partir à deriva...

Partir à deriva...

Cajado numa mão, 
Enrolado num burel,
Sandálias nos pés,
Parti para o deserto.

Ali não há estradas. 
Não há veredas traçadas,
De propósito,
Ou por acaso,
Pelos pés das gentes
Tresmalhadas.

Não há semáforos.
Nem polícias de costumes.
Só há dunas.
Secas.
E a liberdade pura
De girar.

Olhando o chão,
Por causa dos espinhos
Que não são espinhos.
Só querem viver
A sua sorte de ser vivos.
Onde a natura crua
Os prendeu.

Olhar as estrelas.
Lá no alto,
Minhas vizinhas.

Contá-las uma a uma.
Com elas fazer desenhos,
Naquele grande quadro preto.

Fugir do sol escaldante,
Nem que seja num buraco.
De preferência para um oásis.

Seguir em frente,
Nunca mais olhar para trás.

Sem ponteiros de relógio
A despedaçar-me a vida.
Pondo tabiques
Ao rio do meu viver.

Desde a nascente
Até à foz.

Voar na vida
É privilégio
Só de alguns.
Aqueles mesmo, loucos,
Que se prendem
E algemam,
Numa gaiola.

Estar mesmo vivo
É viver em liberdade...

Ouvindo Hélène Grimaud
Berlim, 6 de Maio de 2014
6h29m
Joaquim Luís Mendes Gomes