segunda-feira, 29 de abril de 2013


Vivendo o passado…

 

Talvez um dia eu esqueça.

Hoje é que não.

Era janeiro em forma.

Fazia frio e vento. Por vezes, neve.

Vim de comboio. Em primeira classe.

Já era um senhor!...

 

Desde Caíde d’El Rey.

Próximo do Douro.

Rumo a Tomar.

Cidade, para mim, ignota.

Só do mapa e de ouvir falar. 

O  Rio Nabão,

Afluente do Zêzere,

Afluente do Tejo,

A banha e lhe banha os pés.

 

Tem um Convento de Cristo, lá em cima

Que um dia fui ver.

Ó maravilha!

Um poema de fausto,

Em pedras lavradas.

Pouca gente o conhece

Como bem merecia.

 

Aqui vim dar em janeiro.

Ao quartel general.

Um aspirante oficial.

Saído de Mafra.

De pouca dura, o sol.

Foram só duas semanas.

Por sorte ou destino

Arranquei para o Funchal…

Outro deslumbramento.

Ia dar que falar.

Aí fiquei noivo,

Num abrir e fechar.

Cinco dezenas de anos volvidos,

Voltei a Tomar.

Minha mulher

E filho mais velho.

Pus-me a sonhar…

E não esqueço.

 

Tomar, 25 de Abril de 2013

20h 56m

 

Joaquim Luís M. Mendes Gomes

 

A caminho da glória…

 

Tomei o meu cavalo,

Na lezíria da paz.

Armei-me cavaleiro,

Na batalha da vida.

 

Fui a galope, veloz,

Pelas cordilheiras da sorte.

 

Travei refregas mortais.

Com fogo de guerra.

Que me inflamaram de vida

E me fizeram crescer.

 

Minha espada apurada

Em fornalha de forja,

Vibrou golpes mortais,

Em terras sem luz.

 

Ateei labaredas

Em silvados silvestres

E ervas daninhas,

Povoados de répteis,

Com veneno na língua.

 

Fui porta-bandeira

Em torneios a sério

Dum reino real.

Que ajudei a crescer.

 

Agora, só espero

O condado de luz,

Ao pé do Senhor,

Na glória final.

 

Ouvindo  “silêncio” de Beethoven

 

Mafra, 29 de Abril de 2013

9h5m

Joaquim Luís M. Mendes Gomes

domingo, 28 de abril de 2013


Lembranças passadas…

Santa noite das noitadas
De São Pedro e Santa Quitéria,
Lá bem no alto daquele monte
Que me viu nascer, há tanto.

Com foguetes iluminados
A fugirem pelo céu, loucos.
Com refregas rijas
Entre as bandas musicais caseiras.

Das festadas
E dos bolinhos de bacalhau,
A tostão.
Das canecas de porcelana
Sangrando de verde.

Dos sermões de santos
Que faziam chorar as pedras.
Nunca mais acabavam…

Das procissões de velas acesas
A derreter p’las mãos.
Dos anjinhos breves
A chorar de pranto. 

Dos morteiros medonhos
Que estremeciam a terra.
Dos bombos raivosos
De tanto baterem.
Dos mendigos nus,
Com roupas rasgadas,
E as chagas abertas,
A fazerem pena.

…Já foi há tanto!…

Mafra, 28 de Abril de 2013
17h53m
Joaquim Luís M. Mendes Gomes


Reencontro…quase perfeito

 

Fazia tanto tempo que me perdi.

 Estava cansado de me procurar.

Sem sucesso.

Cada vez me desconhecia mais.

Cada dia, novas surpresas.

 

Agora, voltei a sentir em mim

O pulsar forte de todo o universo.

Tantas galáxias estavam escondidas.

Um enorme eclipse me encobriu,

Todo este tempo.

A escuridão e o negrume basso

Foram seu preço.

 

Mas valeu a pena.

Renasceu o sol

E fez-se dia radiante.

Voltou a haver a primavera.

Já posso, de novo,

Encher minhas jarras

Com lindas flores

E ouvir o cuco da ramalheira.

 

Voltou de novo a feira de Maio,

Com carrocéis

E o poço da morte falsa, em bicicleta.  

 

Há gigantones de caras a rir, na estrada,

Às gargalhadas.

Oiço festadas alegres

E bebo vinho da pipa.

 

Só me falta o farnel

Que minha mãe levava

Para a festa verde do São Pedro…

 

Mafra, 28 de Abril de 2013

16h58m

Joaquim Luís M. Mendes Gomes

Tem paciência comigo!...

 

Venho de longe,

Pisando a terra,

Com todo respeito.

Sorvendo do vento a força

Como um moinho no tempo,

No cimo do monte.

 

Escondia em mim,

Sem eu dar conta,

Numa caixa oculta,

Um tesouro de ouro e da prata mais fina.

 

Sofri temporais.

Chuvas de angústia.

Meus ossos rugiram de frio.

Tive a sede maldita, ao sol,

No meio da guerra.

Trepei caracol,

À árvore da luz,

Enchi meu baú

Com cristais do saber

E pepitas de belo.

 

Cantei, chorei,

Dei asas ao sonho.

 Perdi-me sozinho,  

Em caminhos cruzados.

Quase perdido.

Brilhava no céu uma estrela constante,

Que me enchia de luz.

Me ensinava o caminho.

 

Por isso, aqui estou,

Cantando, orando,

Umas vezes, rindo e sorrindo,

Outras, zangado e espumando,

Com o que sinto e vejo à volta…

E, sem o querer,  

Fazendo sofrer…e chorar

Quem vai a meu lado…

 

Bem no fundo, sou como tu,

Que, com tanta paciência,

Me estás a ouvir…

 

Ouvindo André Rieu,

 

Mafra, 28 de Abril de 2013

9h09m

Joaquim Luís M. Mendes Gomes

sábado, 27 de abril de 2013


…Regressei da Guiné

 

Dei comigo voando em sonho.

Numa terra distante.

Verde, cheia de rios, correndo.

Havia palmeiras e arcos de terras.

Encharcadas de água, fazendo arroz.

 

Cantavam aves de porte gigante.

E feras escondidas, de olhos em brasa.

Ouviagemidos de casas,

Chorando soluços.

Fogueiras a arder, debaixo da lua.

De festa ou de luto.

Alguém importante,

Morria ou se ia casar.

 

Batiam tambores

Em batuques sem fim.

Anúncio de guerra,

Ou correio de novas

Que se queriam ao longe levar.

 

E sobas imponentes,

De cabelos grisalhos.

E vestes compridas.

Julgando irmãos.

Pelas leis do costume,

Sem favores a ninguém.

Havia também mercados em festa,

Carregados de cores.

Mulheres de açafates à cabeça,

E meninos às costas.

Jovens sadios,

Com arcos e flechas,

Fazendo de índios, vadios,

Jogando às guerras,

Como se fossem reais.  

 

Acordei, a chegar …

Ó que pena e saudade!…

Do chão da Guiné.

 

Mafra, 27 de Abril de 2013

19h29m

Joaquim Luís M. Mendes Gomes

À Sintra que eu conheci…

 

 

Não existe o céu nem a terra,

À vista,

Cerca de ti.

 

Só existe o chão de terra verde. 

Que tu pisas levemente,

Sem te dares conta.

 

Teus passos, serenos,

 Tão distantes, solitários,

Seguem voltas e fazem arcos

Como traços, como laços

Que só prendem

Quem te vê.

 

Não há espaços.

Escuros,

Fora de ti.

 

Todo o universo brilha

Com a luz

Do teu olhar.

 

Tens estrelas e diademas.

E coroas fulgurantes.

Diamantes, brilhantes e rubis,

Carregados de luar. 

 

Teus olhos,

Fazem ondas inebriantes

Derramam brisas.

Tecem lendas

E contam histórias breves.

De encantar.

Como cantos de sereias,

Enamoradas,

Que esvoaçam pelos ares.

 

Mafra, 27 de Abril de 2013

17h07m

Joaquim Luís M. Mendes Gomes

sexta-feira, 26 de abril de 2013


Sem música e sonho,

A  vida não tem sabor.

Falta-lhe a luz.

É como a noite escura,

Sem estrelas no céu

Ou a lua a dar luar.

 

É tudo menos um festim.

Pode ter mesas fartas.

Grandes vestes e ornamentos.

Penteados bonitos.

Carros de luxo.

Ostentações.

 

Se meus olhos nada mais vêem,

Para trás daquele monte,

Se não oiço o chilrear das aves,

Nem o silvo das ventanias,

As sereias do alto mar,

 

Se me estendo como um morto,

Ao longo, no meu leito,

Só ressono e não sonho,

Em sono profundo,

Mais valeria nunca ter nascido

E oferecer a outro o meu lugar.

 

Mafra, 27 de Abril de 2013

7h45m

Joaquim Luís M. Mendes Gomes

Viagem de sonho…

 

Deixei-me embalar

Pelas ondas do sono.

Meu pensamento voou.

Foi pelo mundo.

 

Viu caravelas,

Paquetes gigantes

Navegando nos mares.

 

Viu aeronaves,

Sulcando os ares.

Alcançou cumeadas.

Moinhos de vento,

Pertinho dos céus.

 

Pradarias de sonho.

Florestas selvagens,

Onde o homem não esteve.

 

Rios serpentes,

Correndo nos vales.

Castelos de sonho, vazios,

Nos cimos dos montes.

 

Igrejas com cruzes,

Rezando aos céus.

 

Praias de areia,

Desertas de gente.

Cavalgando camelos.

 

Comboios em marcha,

À volta da terra.

Casas assombradas,

À borda dos lagos.

Migrações de cegonhas,

Sem malas nas asas.

E bandos de cisnes  

Luzindo ao sol.

 

Ouvi trovoadas,

Cheinhas de medo

E vulcões a gritar,

Fugindo do fogo da terra.

 

Acordei saciado,

De tanto sonhar.

 

Mafra, 26 de Abril de 2013

18h18m

Joaquim Luís M. Mendes Gomes

Para depois lembrar…

 

 

Voltei de Tomar.

Hotel a quem os templários deram seu nome.

Uma suite imperial. Em promoção.

E que jardim!...

Oxalá fosse acessível a todo mortal.

 

Um serviço de excelência.

O Nabão manso e amante

E um cortinado verde a todo o redor.

 

Muito sol e o convento ao alto,

Formoso, em pedra e renda.

Obra de fé!...

 

Que arredores soberbos,

Que o Zêzere tece.

De azul e espuma.

Um céu de luz

Sempre a luzir.

 

E, ao cair da noite,

Subia calma em balão de nácar,

Uma lua dourada.

Como princesa.

Do lado nascente.

 

Do casario denso, em arco,

Sobranceiro ao rio,

Jorravam luzes em catarta,

Como um presépio a arder.

 

Que espectáculo lindo,

Ó que fulgor!...

Tanta fartura,

Ali, em família, vimos,

Sem pagar factura.

Para compensar…

No vinte e cinco de Abril!...

 

Mafra, 26 de Abril, de 2013

15h12m

Joaquim Luís M. Mendes Gomes

Fosse a Terra um oásis…

 

Pudesse eu transformar a terra

Num oásis florido,

Muita água fresca a correr,

Acampasse nele o mundo inteiro,

Houvesse sombra benfazeja,

Sem angústia e sem dor.

 

Houvesse fartura de comida

Sadia, natural, sem químicas,

Que sobrasse,

 

Brilhasse o sol da harmonia,

Entre todos,

E os caminhos fossem limpos,

Voltados para os cumes,

E o subir para o bem e bom

Fosse o sentido de vida  

De cada mortal.

 

Nunca nuvens negras, pardacentas,

Cheias de guerras,

Fosse a paz o sol brilhante

De cada dia.

 

Um cordão forte

De abraços e de sorrisos,

Que brotasse da alegria,

Permanente,

Ligasse as gentes.

 

Houvesse paz

E cada um chegasse sempre

Ao sítio certo

Para onde dessem suas forças…

 

Ouvindo Whitney Houston

 

Tomar, 27 de Abril de 2013

8h08m

Joaquim Luís M. Mendes Gomes

quinta-feira, 25 de abril de 2013


Vinte e Cinco de Abril

 

Naquele dia, da madrugada,

Outro sol raiou.

Trazia clarões de luz…

Já não eram raiados de sangue e negro.

 

Bateu em chama, nas janelas

E abriu portas cerradas da liberdade….

 

Trouxe ares de mar,

Com sabor a sal e ao sargaço

E  húmus da terra….

Trouxe a festa rija

Da fraternidade eterna

Que fez da rua um palco,

Alegre, sem figurantes.

 

Fechou para sempre,

As portas da guerra

E abriu as da liberdade.

Para pensar e ser,

Como somos desde a raiz.

Todos iguais.

 

Foram fora todos os trastes velhos,

Por fora, só verniz e aparência.

Por dentro, já carcomidos.

 

Os olhos brilharam de tanta alegria.

Foi a esperança …

Vã!...Durou pouco!

Doutro País…

Que não é o de hoje.
Foi só um sonho!...

 

Ouvindo Lang Lang em “ sonho de Schuman”

 

Mafra, 25 de Abril de 2013

8h00m

 

Joaquim Luís M. Mendes Gomes

quarta-feira, 24 de abril de 2013

Sinto saudades…
Sinto saudades
De quando era garoto,
O dia nascia,
Ouvia o assobiar de meu pai,
Na oficina.
Tesoura gigante na mão
Talhando os fatos.
Fazenda e cotim.
Minha mãe chegava da vila,
Carregadinha de pão,
Cheirava a fermento e farinha,
Era padeira.
Minha irmã, de faces rosadas,
E olhos brilhantes,
Pegava no alguidar à cabeça
E ia pró tanque lavar,
Cantando afinada,
Modinhas
E o fado de Amália,
Sob a ramada de uvas maduras.
Ouvia as poupas,
Contentes,
Escondidas nos ramos.
Esvoaçavam pardais,
No meio dos tojos das matas.
E o gato preguiça,
Se espreguiçando ao sol,
Ainda dormente,
Pensava nas gatas.
No estradão em frente,
Passavam beatas tristonhas
Que iam pra missa.
E carros de bois, trilhando a calçada,
Desciam gemendo,
A caminho da lavoura dos campos.
De longe vinham agudos
Os silvos das fábricas,
De ferro e sapatos.
Ao fundo,
Na forja do “Mói”,
Batia pesado o malho de ferro,
Sobre a bigorna, de aço,
Aguçando os guilhos,
Que furavam as pedras lavradas.
Pelo quintal, à solta,
Havia um galo e galinhas alegres
Qque ponham os ovos
E debicavam o chão.
De repente,
Fazia o silêncio no ar,
E caíam dolentes
Do sino da igreja,
As nove trindades
Para a gente rezar.
Tudo era real. Tudo era divino.
- Oh Que saudades!..
Ouvindo Lang Lang, em concerto para piano de Chopin
Mafra, 24 de Abril de 2013
7h41m
Joaquim Luís

terça-feira, 23 de abril de 2013


Os meus anseios

 

Sou contra os terramotos

E os vendavais.

Sou contra os tribunais

Que julgam mal.

 

Detesto condenações de iguais

Por outros piores.

 

Se fosse possível,

Acabaria com tudo de vez,

O que traz o mal.

 

Daria a prisão perpétua

A quem faz do mal sua profissão.

 

Distribuiria prémios

A quem desse amor gratuito,

Sem moeda de troca,

A vénia

Da humilhação.

 

Revoltaria a escravatura,

Contra toda a espécie

De ditaduras

Sobre  os corpos

E sobre as almas.

 

Só descansaria

Naquele dia

Em que em todo o mundo

Reinasse a paz.

 

Mafra, 23 de Abril de 2013

14h02m

Joaquim Luís M. Mendes Gomes