ilusória eternidade...

Ilusória eternidade...

Ao raiar da vida e, nas primeiras dezenas de anos,

Vemos a terra uma estação final,

Comboios chegando,

Outros partindo,

Onde ficaremos para sempre,

Como residentes viageiros

Insaciáveis..

Muita vida e muita esperança,

Muita vontade de correr mundo,

Subir...descer...escalar.

Escrever livros.

Fazer obra ...

Vasculhar a ciência,

Interrogar porquês...

Dar sentenças.

Ser alguém com fama.

Aparecer nos jornais.

Dominar os outros,

Nunca o contrário.

Ser abastado.

Trocar de carro.

Cada vez melhor,

De ano a ano.

Ter uma casa linda

Um formoso par,

De companhia,

Um lar luzente,

Cheio de amor,

À borda do mar.

Ou na encosta dum rio.

Praticar o esqui,

Nas estâncias de inverno.

Fazer cruzeiros.

Por esses mares

Conhecer os povos diferentes

Doutras paragens.

Sentir-lhe as cores

E suas formas de viver.

Sonhar que tudo e mais

É de cá e

É para ficar...

Lutamos contra a fome

E o sofrimento.

A qualquer preço.

E que tudo seja um maná...

Subtilmente,

Sem se dar conta,

Numa dada hora,

Damos por nós,

Numa sensação instável.

O chão tremendo.

É o pai que vai...

Às vezes, o amigo do nossa infância,

Por acidente?...

Custa...mas...um caso de asar!...

Por um AVC!...

Já faz pensar.

E se sentem os ossos

Ao mudar da lua...

Que sempre dormiram,

Nos bancos da frente.

Gemem as costas,

Embarcação nas ondas,

Vêm as névoas,

Frente ao olhar,

Embaciando tudo,

Como num espelho

A água a ferver...

Chamam por nós

E já não ouvimos...

À primeira vez.

Um a um,

Se vai o cabelo.

Cada vez mais branco...

Olhamos à volta,

Cada vez mais cinzento.

E a sombra escura

Entra em nós...

Impertinente.

As noites longas...

Fazem pensar.

No bem e mal

Que já fizemos...

Passam em claro.

Um moinho no rio...

Sempre rolando,

Sempre gemendo.

Então, afinal!...

O que é a vida?...

Ai de mim,

Se, desde sempre,

Não a visse com outra luz!...

Com um olhar distante

Para além do céu...

E não me sentisse

Preso ao Rei e Pai

Que,

Sabe-se lá porquê...

Me fez viver.

Um dia saberei!...

Ouvindo Chopin. Piano concerto nº 2 por Rubinstein, no youtube...

Mafra, 13 de Março de 2014

6h16m

Joaquim Luís Mendes Gomes